Segundo a história do mundo, na primeira família existente, os herdeiros Caim e Abel, se desentenderam e, aconteceu o primeiro crime, da seqüência absurda de muitos outros, ou seja, Caim matou Abel. A partir daí acreditamos que foi introduzido na civilização as maldades emergentes que hoje habitam todos os setores da sociedade. E, aleatoriamente, escolhemos uma das maldades, para reproduzir o leque extenso de coisas ruins que convivem entre nós, com bastante aceitação. A princípio podemos considerar uma delas que é a decepção, a qual quando nos ocorre, faz um estrago muito grande dentro de nós. Haja vista, que prazerosamente nos dispomos de tais artimanhas no intuito de querermos nos destacar ou brilhar de qualquer jeito e, para conseguirmos tais intentos, não nos importamos com os resultados, ou seja, se vai ou não magoar outras pessoas. Por isso, não escolhemos as ferramentas que podemos usar, apelamos para qualquer uma, basta que visualizemos a possibilidade de alcançar sucesso, custe o que custar. Considerando isso podemos afirmar que existe um mundaréu infindável de decepções. Todavia, aquela que nos fere mais se refere a que fizemos mal juízo, ou seja pensávamos que a pessoa fosse de um jeito e, de repente ela se mostra outra, totalmente diferente. Em vista disso, o que nos aborrece mais é chegamos à infeliz conclusão de que ninguém está nem aí para com ninguém. Digo isso porque todo o santo dia vemos uma cena lamentável sobre reações no mínimo contraditórias. Tanto é verdade que se formos enumerar, teremos uma quantidade tão absurdamente grande que faltará espaços para apresentá-las. Em todos os seguimentos vemos decepções ocorrendo, tanto na família, no trabalho, nas recreações, na política, na religião, enfim, não há exceção. Uma mãe, exteriormente sempre defende e está do lado do filho, todavia, quantas delas que no âmago de seu coração, sente profundamente que seu maior tesouro a decepcionou. Quanta tristeza, quanta dor, uma vez que no íntimo esta mãe sabe que também fracassou e, reconhece que a sua maior criação, sua pedra preciosa, provocou um ofuscamento terrível no projeto que homeopaticamente ela havia idealizado para ele, seu filho amado. Quantos casamentos desmanchados, ou quando não, acabados pela convivência desastrosamente superada pela vida infeliz de uma rotina diária que, mansamente, passo a passo engoliu o amor. Na verdade os cônjuges que assim vivem ou viveram, vêem que sua jornada juntos nada representou, apenas estavam juntos, para construírem no fim uma sonora decepção. O amor não foi lapidado, continuou uma pedra bruta, a rotina sobrepujou a grandeza da união e o matrimônio foi banalizado, transformou-se num produto qualquer que pode ser encontrado numa prateleira de supermercado. É oportuno citar aqui uma colocação do grande poeta Vinicius de Morais, em seu livro “Soneto da Fidelidade”, diz ele: “que numa união o que mais vale é a sua intensidade e não a longevidade”, querendo dizer que é preciso amar muito, o tempo é alguma coisa secundária. Quantas vezes nos vemos surpreendidos por atitudes, no mínimo incompreensíveis, de amigos queridos que sem cabimento algum nos decepcionaram e, ainda muitos outros o farão. E, mediante aquela reação, passamos horas, dias a fins, para encontrar uma resposta, com certeza, não a encontraremos. Sendo que o pior de tudo é que fica dentro da gente um terrível gosto de “cabo de guarda-chuva na boca”, ao constatar que não representávamos nada para aquele suposto amigo. Como já temos na vida uma caminhada um pouco maior, é natural que sempre nos vem à mente alguma passagem do passado. E, considerando isto, me lembrei também de uma antiga melodia cantada pelo saudoso Cauby Peixoto, a qual, numa das estrofes dizia mais ou menos assim: “ninguém é de ninguém na vida tudo passa, ninguém é de ninguém até quem nos abraça. Já tive a sensação que tinha um grande amor, hoje só restou à desilusão de saber que ninguém é de ninguém”. Interessante que nessa reunião de velhos versos de outrora, o lamento é a tônica maior. Sendo que essa constatação de desinteresse entre as pessoas é o que nos machuca mais, provocando um temor inevitável, pois, tal comportamento nos coloca inexoravelmente no caminho da solidão. No entanto, se pensarmos bem, se verificará que esses desenlaces não combinam nem um pouco com os propósitos de Deus, uma vez que fomos criados para viver em comunidade. Porém, infelizmente a todo instante, devido a nossa estupidez estamos sempre tentando desatar essa aliança. Hoje, não se precisa ir muito longe para se notar isso, basta que liguemos a televisão ou passemos os olhos nos periódicos para constatar o fato. Brigas, divórcios, catástrofes, estupros, assassinatos, seqüestros, abandonos, miséria, corrupção, pedofilia, racismo, traição são sinais claros e evidentes de que não sabemos mais aonde as coisas vão parar. Porém, de uma coisa é certa, pois é muito fácil de constatar de que ninguém é de ninguém. Infelizmente.