Dia deste estava eu matutando sobre as pessoas como um todo, sem ter, na verdade, nenhuma escala de valores a ser obedecida. A minha análise girava em torno de como somos inconseqüentes nos relacionamentos, principalmente quando se está em jogo a quem vai abraçar, o ter ou o ser. E, para clarear mais as idéias me lembrei de um conto de autoria desconhecida, o qual refletirá aquilo que diz respeito ao apego material em detrimento as delícias da vida, como segue: Um dia um homem que valorizava o ser mais que o ter, hospedou-se na casa de um parente distante, materialista convicto, numa bela mansão de uma cidade do interior. Depois do jantar, o anfitrião convidou o hóspede para visitar sua galeria de obras de arte e começou a enaltecer os bens materiais de maneira soberba. Falou que o homem vale pelo que possui, pelo patrimônio que consegue acumular durante a sua vida aqui na terra. Exibiu escrituras de propriedades, as mais variadas, jóias, títulos, valores diversos. Depois de ouvir e observar tudo calmamente, o hóspede falou da sua convicção de que os bens da terra não nos pertencem de fato, e que mais cedo ou mais tarde teremos que deixá-los. Argumentou que os verdadeiros valores são as conquistas intelectuais e morais e não as posses terrenas, sempre passageiras. No entanto, o materialista falou com arrogância que era o verdadeiro dono de tudo aquilo e que não havia ninguém no mundo capaz de provar que todos os seus bens não lhe pertenciam. Diante de tanta teimosia, o hóspede propôs-lhe um acordo: “Já que é assim, voltaremos a falar do assunto daqui a cinqüenta anos, está bem”. Disse o dono da casa: “Ora, daqui a cinqüenta anos já estaremos mortos, pois ambos já temos mais de sessenta e cinco de idade”. O hóspede respondeu prontamente: “É por isso mesmo que poderemos discutir o assunto com mais segurança, pois só então você entenderá que tudo isso passou pelas suas mãos, mas, na verdade, nada disso lhe pertencia de fato. Chegará um dia em que você terá que deixar todas as posses materiais e partir, levando consigo somente suas verdadeiras conquistas, que são suas próprias virtudes. E só então você poderá avaliar se é verdadeiramente rico ou não”. O homem materialista ficou contemplando as obras de arte ostentadas nas paredes de sua galeria e, uma sombra de dúvida pairou sobre seu olhar, antes tão seguro. Que diferença fará daqui a cem anos, se você morou em uma mansão ou num casebre? Se comprou roupas numa loja sofisticada ou num bazar beneficente? Se comeu em pratos finos ou em uma marmita? Se pisou em tapetes caros ou em chão batido? Que diferença isso fará daqui a cem anos? Absolutamente nenhuma. No entanto, o que você fizer do seu tempo na terra fará muita diferença em sua vida, não só daqui a cem anos, mas por toda eternidade. Por essa razão, vale a pena pensar no que realmente tem valor duradouro e efetivo, considerando-se que você é o herdeiro de si mesmo. De cujos atos terá que prestar contas a sua própria consciência. Daí constata-se que o mais importante em toda a vida é estar disponível para a humildade, poder cumprimentar os amigos, falar bom dia para o varredor de rua, sorrir para as crianças e para os idosos. Soltar a alma, deixá-la viver com simplicidade, dar asas a imaginação e voar para espaços mais livres e acolhedores. Ter é bom e propicia os confortos da vida, porém, o mais importante é ser, onde o seu “eu” estará sempre nos braços do amor e da amizade. A pessoa materialista jamais será hóspede da felicidade, uma vez que é geneticamente portador de preocupação inconseqüente, obstáculo intransponível para se chegar lá. Despojar-se das coisas materiais não significa jogar fora ou esbanjá-las, mas, sim usá-las dignamente e, jamais ser escravos delas.