Eu sou o bom mesmo

Literalmente essa frase soberba faz parte do ego de milhares e milhões de seres inconseqüentes, que se acham ser o “bom”, independente de qualquer tipo de avaliação. Todos nós, às vezes, não admitimos ou, no íntimo queremos nos enganar sobre o nosso perfil egoísta de querer ser o melhor sem que realmente isto seja verdade. Conseqüentemente, neste particular o nosso status narcisista se expõe tanto, que em certos momentos a razão se desfigura a tal ponto que a gente acaba ficando com inveja da gente mesmo. Agimos tal qual a madrasta da Branca de Neve, diante do falso espelho que norteava a sua vida hipócrita, sempre fazendo a pergunta que todos sabemos, ou seja: “espelho, espelho meu, existe alguém mais bonita que eu”? Infelizmente, nas próprias rodinhas de bate papo entre amigos, desagradavelmente, há sempre um que destoa completamente do grupo. Gosta de ser o alvo das atenções, não dá espaço para ninguém, só ele sabe das coisas e, mais ninguém. E, nesta categoria de pessoas desagradáveis acaba-se também encontrando aqueles que são especialistas em todo tipo de conversa. Ou seja, se o assunto é sobre medicina, o cara sabe, se é sobre circo, futebol, política, enfim, qualquer coisa, o ilustre papudo desempenha o seu papel garbosamente. E, para dar uma definição mais nítida a estes tipos de posturas seria conveniente lembrar alguma história que colaborasse mais efetivamente com o assunto em si. Daí achei oportuno encaixar um conto interessante que veio mesmo a coincidir com a nossa necessidade, como segue: “Diz o conto que em uma comunidade longínqua, lá pelos lados do nordeste brasileiro, aconteceu um temporal violento que acabou por completo com quase todos e, tudo que estivesse ao redor. Morreu a maioria dos habitantes e, centenas e milhares de animais, foi uma verdadeira catástrofe. Dos sobreviventes existentes, um deles ao ser entrevistado pelos órgãos de imprensa do país, contou com detalhes tudo o que tinha acontecido. Inclusive, com ele mesmo que havia perdido tudo, família, cachorro, papagaio, e a casa com todos os pertences. A narrativa contada pelo sobrevivente era carregada de grande emoção, o que levou aos repórteres explorar o máximo possível todas as informações referentes à tragédia. Acontece, porém, que o sobrevivente continuou a contar a história da enchente de seu povoado e, com o passar dos tempos, o mesmo foi ficando especialista no assunto. Fato este que lhe proporcionou uma oportunidade maior de desempenho, fazendo-o tornar-se um excelente palestrante sobre enchentes. A sua competência evoluiu tanto, que até ele próprio começou a se achar o bom da paróquia. Imaginando ser ele o único que tinha conhecimentos sobre enchentes ao ponto de se tornar um profissional da área. Na verdade, o palestrante acabou correndo o mundo todo fazendo palestras sobre o tema, tornou-se então muito famoso e requisitado. Era, portanto, uma estrela bastante iluminada. Todavia, como acontece com todo o ser vivente, um belo dia ele, o contador de tragédias de enchentes, morreu. E, como não poderia deixar de ser diferente, ao chegar ao céu, encontrou-se com São Pedro e, foi se apresentando dizendo: São Pedro, o senhor sabe quem sou eu? Lógico, respondeu o santo, o senhor é aquele que viveu uma tragédia na terra e, tornou-se famoso por ficar narrando o desastre sobre enchente, não é mesmo. O sobrevivente, agora em outro estágio, ficou muito feliz pela fama. Continuando, São Pedro informou ao novo hóspede que ele poderia fazer um pedido antes de ir para o seu cantinho lá no paraíso. Sorridente, pediu que gostaria de fazer a última palestra, sobre a enchente, caso fosse possível. São Pedro todo solícito permitiu, porém, antes, lembrou ao palestrante o seguinte: Olha, veja lá o que senhor vai falar sobre enchente, pois, existe aqui no céu uma alma que se chama Noé e, ele entende demais sobre esse assunto, tanto é que foi ele a pessoa que controlou o Dilúvio. Diante desta constatação, o sobrevivente, um pouco assustado e muito impressionado com a ilustre presença de Noé, sentiu-se diminuído, a ponto de solicitar para São Pedro, dispensa da palestra.” Impressionante, como algumas pessoas demoram tanto para compreender a sua pequenez, infelizmente, existem muitas que precisam até morrer para entender que ninguém sabe tudo, sempre tem alguém que sabe mais. E, para finalizar, dando um recado de graça aos sabichões de plantão, é certo também que quem pensa que sabe tudo, na verdade não sabe nada. Ponto final.