Janeiro vem, janeiro vai

Num gesto sintomático, podemos perceber, claramente, que quando os janeiros vão passando, a gente vai começando a criar o hábito de olhar muito mais para trás do que para frente. Num livro interessante sobre o assunto, o autor declinava esta situação, afirmando que o idoso, começa a olhar mais para trás, porque é lá que mora o seu maior tempo de existência. E, é lá que residem os seus melhores momentos e, os piores, às vezes, nem tanto. Dentro desta ótica, cremos que existe certa lógica nesta definição, uma vez que retrocedendo ao tempo, lá no período áureo da juventude, todos os obstáculos eram, possivelmente, transponíveis. E, quando não os eram, a nossa clareza de raciocínio era bastante suficiente para criar outras alternativas. Em contra partida, na velhice, essa disposição toda, já não se compactua com a necessidade da presença indispensável do vigor físico. Muito pelo contrário, as dificuldades são inúmeras, tanto é verdade, que quando as mesmas se fazem presentes, há, infalivelmente, a necessidade latente da presença de ajuda para realizá-las. Lamentavelmente, já ficou devidamente constatado que na maioria, das vezes, em que se precisou desta ajuda, ela estava ausente. Daí é onde podemos concluir o porquê do olhar do idoso estar sempre voltado para trás, mais, especificamente para o passado. Passado este que, manhosamente, acomodava de forma nítida todas as passagens da vida, onde perceptivamente, dava-se para notar que entre o esforço dispendido havia uma recompensa equilibrada. Haja vista que, as batalhas se tornavam justas, uma vez que a disposição estava à altura dos obstáculos apresentados. E, para dificultar um pouquinho mais estamos vivendo um conflito de gerações, onde a velocidade das mudanças, até para os mais contemporâneos, está, demasiadamente, difícil de administrar, imaginem para as pessoas idosas. É, facilmente visível que há nestas épocas atuais um armazenamento acelerado de dificuldades, motivado pelas mudanças bruscas, ao ponto de nos provocar descompassos com o ritmo das coisas. No entanto, é verdade que no aspecto tecnológico, essas mudanças são importantes, infelizmente, no quadro social da convivência humana, é de se reconhecer também que as mesmas têm causados sérios transtornos. Podemos citar apenas um exemplo, a utilização indiscriminada dentro dos lares da internet, onde tem trazido resistências homéricas para se manter a disciplina e a criação. Vejam só que este turbilhão de mudanças acaba por si só provocando um envolvimento tão abrangente que, lamentavelmente, começamos a perder de vista as nossas origens. E, consequentemente, os nossos velhos começam a se distanciar desta realidade, que se nos apercebermos, de repente, não passam de páginas viradas. Com isso, a nossa paciência vai também se esgotando com relação a eles, em nossos espaços eles não possuem lugares, enfim, os janeiros vem e vão, o tempo voa e com ele a esperança bate asas também. São, portanto, tais atitudes que justificam, o porquê dos olhos de nossos idosos estarem sempre voltados para trás, uma vez que para frente não existe perspectiva, apenas o vazio está lá, imenso e triste, é o reflexo da solidão. Independentemente, de tudo isso, cremos que a velhice deveria ser bem mais contemplada, considerando todos os percalços que se vencem para chegar até ela. Pensem nisso.

Arquimedes Neves – Nei

www.neineves.com.br